Era uma vez… o cross-selling
Historicamente, alguns temas são mais sensíveis de serem tratados pelos escritórios de advocacia e costumam ser comuns à grande maioria deles, como por exemplo, o cross-selling – no bom português, a “venda cruzada”.
Pauta de discussões internas constantes, que geralmente resultam nos extremos de “nada a fazer” ou em um programa de “venda” forçada aos clientes.
Os casos tidos como “sucesso” partem de uma medição mais ou menos assim: quantas áreas do escritório são trabalhadas com o cliente e qual o faturamento gerado individualmente pelas práticas e no conjunto.
“Há outras áreas que podemos apresentar ao cliente?”, a pergunta-mestre para toda discussão de cross-selling.
Confesso que, no passado, eu mesma achava isso “normal” quando se tratava de desenvolvimento de negócios pelos escritórios de advocacia.
Afinal, é uma prática tão comum na grande maioria dos mercados, não é mesmo? Mas, o setor conhecido como “serviços profissionais” e, mais especificamente, o setor jurídico, tem outra dinâmica. Ideias simplesmente importadas de outros segmentos tendem a não trazer bons resultados.
Continuemos falando do cross-selling, ainda bastante almejado por muitos escritórios.
Na maioria das vezes, independente do número de áreas em atividade com o cliente, mantem-se os silos organizacionais, com equipes trabalhando cada qual em seu “território” e, em casos ainda mais críticos, departamentalizadas dentro do próprio departamento.
Ninguém sabe muito bem o que cada área tem feito para o cliente, porque tem feito e para o que tem feito.
A importância de cada prática junto à empresa é geralmente medida pelo resultado de faturamento – não deixa de ser um indicativo; longe de ser o único.
Um diretor jurídico certa vez citou uma área como sendo a mais relevante para o principal projeto da companhia inteira, mas a prática não estava no radar do escritório, por mais óbvio que parecesse a necessidade de colocá-la na “linha de frente”.
E o que o cliente experimenta, espera e está disposto a pagar?
O cliente certamente experimenta o serviço das diversas áreas do escritório, que entregam isoladamente a sua expertise, gerando diferentes experiências de “marca”.
Ele compara a performance de uma e outra prática – porque a forma com que realizamos o trabalho o induz a isso -, e a experiência, de novo, é semelhante a trabalhar com diferentes escritórios.
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Algum valor adicionado nessa prestação de serviços? Sob a ótica do cliente, com certeza, não. Sob a ótica de gestão da marca do escritório, frustrante.
Todos vamos concordar que o cliente espera receber soluções para suas necessidades mais complexas. Está disposto a pagar por isso, ou melhor, investir. Está cada vez mais intolerante a pagar por ineficiência, por coordenação pró-forma e por retrabalho.
O trabalho colaborativo e a orientação pela necessidade do cliente
Com ambientes de negócios tão dinâmicos, também complexos e interligados, é quase impossível imaginar atualmente que haja solução jurídica pelo conhecimento de uma única área ou profissional, por melhor que seja ele(a).
A verdade é que poucos setores de mercado são tão propícios ao trabalho colaborativo quanto o de serviços jurídicos, essencialmente para a atividade empresarial. Então, por que esse modelo se torna tão difícil na prática?
Há uma série de razões que podem se completar na resposta a essa pergunta. O modelo de compensação do escritório, o nível da “personalização” e a inseparabilidade na relação advogado-cliente, o senso de “posse” individual sobre o cliente, entre tantos outros motivos.
Mas, talvez, o engano histórico tenha sido achar que teríamos sucesso desenvolvendo novos negócios pelo cross-selling, que seria olhar a questão pela lente de benefícios para o escritório.
Os “avanços” nesse sentido traduzem-se no que já pontuamos anteriormente: ofertas de serviços agressivas aos clientes, demonstrando falta de conhecimento da empresa, do mercado em que está inserida e, essencialmente, de empatia.
Se o cliente estiver no centro da orientação dos nossos serviços, o foco – e a dificuldade – não será “vender” uma ou outra área pretendida pelo escritório, mas sim entregar a solução que o cliente precisa, quaisquer que sejam as áreas envolvidas; integrando-as de maneira que gerem valor adicionado.
A pauta deixa de ser “desenvolvimento de negócios”, mas sim, “o cliente”; o quanto conhecemos de seu negócio, de seu mercado, das suas reais necessidades, dos riscos jurídicos – e não jurídicos – em sua operação – que ele pode não estar observando.
E, quem sabe, passamos a gerar oportunidades aos clientes. Para isso, precisamos aprender a somar expertises, criar uma cultura e mecanismos que favoreçam a colaboratividade dos profissionais das diferentes áreas de prática e dos setores de indústria.
Precisamos, ainda, estar prontos para trabalhar de forma colaborativa com outros prestadores de serviços, inclusive jurídicos, porque a solução que o cliente precisa está cada vez mais demandando esse movimento.
Se não conseguirmos praticar a colaboratividade sequer internamente, pensemos em quão difícil será resistir a essa exigência natural do mercado.
Por Andréia Gomes, Sócia-diretora da AGomes Marketing Consultoria, Cofundadora da Latin America Legal Marketing Alliance (LALMA)
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