A POSSE pode ser documentada através de ESCRITURA PÚBLICA e com isso agregar importantes caracteres ao “negócio” como a perenidade oriunda de todo e qualquer fato ou negócio que seja entabulado nas Notas de Tabelião (afinal de contas, sabe aquela Escritura que o seu bizavô fez há 70 anos? Com certeza ela estará lá no Cartório, guardada pelo Oficial, mesmo que ele não seja o mesmo que carimbou e assinou o ato na época; mas e se ela não estiver? Xiii isso é assunto para outro post…)
Aqui no Rio de Janeiro o Novo Código de Normas Extrajudiciais (Provimento CGJ/RJ 87/2022) manteve a possibilidade da lavratura das Escrituras DECLARATÓRIA DE POSSE e de CESSÃO DE POSSE. A regra agora consta do art. 384 que esclarece:
“Art. 384. Nas escrituras públicas declaratórias de posse e de cessão de direitos possessórios, deverá constar, obrigatoriamente, declaração de que o ato não tem valor como confirmação ou estabelecimento de propriedade, servindo, apenas à instrução de ação própria, podendo o tabelião, ao seu prudente arbítrio, exigir a presença de testemunhas ou outros dados objetivos da posse”.
Com todo acerto o NCN em louvável passagem também reconhece, em total consonância com o STJ (REsp 1.984.487/MG. J. em 21/06/2022) expressamente a possibilidade de INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL DOS DIREITOS POSSESSÓRIOS, senão vejamos:
“Art. 445. Podem ser objeto de inventário bens e direitos, incluindo imóveis pendentes de regularização junto ao Poder Público, assim como direitos possessórios sobre imóveis, devendo constar do ato a ciência dos interessados de que o registro de propriedade ficará condicionado à sua efetiva regularização.
Parágrafo único. O inventário do direito possessório, por si só, não confere direito subjetivo aos herdeiros quanto à futura usucapião, cabendo ao tabelião aferir os elementos para lavratura da ata notarial e ao oficial registrador a viabilidade do seu registro”.
Importante pontuar que da mesma forma em que se observa que é possível a transação da posse através de ESCRITURA PÚBLICA já não podemos dizer que essa seja a forma obrigatória – ou seja, também pode ser a posse documentada através de Instrumento Particular (como inclusive o mesmo STJ já assentou – REsp 61.165-2/RS. J. em 23/04/1996).
Pois bem, demonstrada a POSSE através do conjunto probatório necessário, fica a pergunta: poderia o interessado se valer do instituto da ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA para a regularização junto ao Cartório do RGI?
A resposta nos parece ser NEGATIVA. A posse tem valor e importância jurídica e econômica como sabemos; ordinariamente ela pode ser convertida em propriedade através da USUCAPIÃO, desde que preenchidos os requisitos legais e principalmente denotando essa posse os caractéres exigidos por Lei (“animus domini”, essencialmente já que a posse que presta para Usucapião precisa ser a posse qualificada; não é qualquer “posse”). Hoje em dia, como sabemos, a Usucapião pode ser manejada tanto pela via judicial quanto pela via extrajudicial (sem processo judicial), nos termos do art. 216-A da LRP/1973.
O procedimento de ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA representa uma outra importante ferramenta para regularização de imóveis – mas nem de longe se presta a resolver todo e qualquer “enfermidade imobiliária”. Desde sempre era manejada somente pela via judicial. Segundo importante obra sobre o assunto assinada pelo Magistrado ARNALDO MARMITT (Adjudicação Compulsória. 1995),
“A ação de adjudicação compulsória é o expediente pelo qual se obtém a satisfação de uma obrigação de fazer, de prestar declaração de vontade, através de uma sentença com os mesmos efeitos da declaração omitida. Assegura o direito à declaração judicial que ordena a incorporação do imóvel objeto do contrato ao patrimônio do adquirente. O direito à escritura definitiva resulta de relação obrigacional. A sentença de mérito tem natureza constitutiva, porquanto reconhece o direito à alteração da situação jurídica originária e ao mesmo tempo acarreta esta mudança”.
A Adjudicação Compulsória é instituto que exige para seu correto manejo e êxito da pretensão – tanto na via judicial quanto na via extrajudicial – o preenchimento de determinados requisitos e um deles é a existência de compromisso ou promessa de compra e venda sem a cláusula de arrependimento – pontos inexistentes quando se trata de Instrumento declaratório ou de cessão de posse;
Do referido mestre ainda podemos colher as seguintes lições na obra já citada:
“O escrito particular de cessão de direitos possessórios não se confunde com o compromisso de compra e venda. Não se constitui em título hábil para o exercício da adjudicação, ainda que denominado “escritura particular de cessão de direitos de posse”, e redigido em alto estilo. O direito à adjudicação compulsória pressupõe a existência de contrato sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e venda e cessão de direitos de imóveis não loteados, nos termos em que dispõe o art. 22 do Decreto-lei n° 58/37. Os direitos cedidos são os decorrentes do compromisso de compra e venda anterior. Para poderem ser cedidos a outrem, óbvio que devam existir efetivamente. Não se transfere o que não existe, o que não se tem. Não basta, pois, ceder direitos de posse, mas o que realmente deve haver é um compromisso à venda de um imóvel de que se é titular, ou a cessão de direitos resultantes de compromisso de que se é titular”.
Pior ainda a situação daquele que não tem nem a Cessão de Posse mas a Declaratória de Posse que é o instrumento unilateral (público ou particular) onde o interessado apenas assenta que tem a posse originalmente, sem tê-la recebido de outrem. Para esses, como já esclarecemos em outras passagens, a solução poderá estar com a USUCAPIÃO promovida judicial ou extrajudicialmente.
Leia também: Ata notarial para adjudicação compulsória extrajudicial: obrigatória? Facultativa? Desnecessária? Confira!
POR FIM, a jurisprudência do TJRS em perfeita sintonia com a doutrina analisada:
“TJRS. 70078291820. J. em: 27/09/2018. APELAÇÃO CÍVEL. ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. ESCRITURA PÚBLICA DE CESSÃO DE DIREITOS DE POSSE DO IMÓVEL. AUSÊNCIA DO REQUISITO DA COMPRA E VENDA. – A ação de adjudicação compulsória é a ação judicial destinada a promover o registro imobiliário necessário à transmissão da propriedade, baseado em contrato preliminar – Ausente o requisito da compra e venda, apenas existindo Escritura Pública de Cessão de Direitos de Posse, é de ser mantida sentença de improcedência da demanda diante da inexistência de requisito essencial. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME”.
Original de Julio Martins
Nos siga no
Participe do nosso grupo no
Nos siga no
Google News
Participe do nosso grupo no
WhatsApp