A Medida provisória 927 de 2020 trouxe uma série de regras para o banco de horas em razão do estado de calamidade pública trazido pela COVID-19. Entretanto, a medida provisória não prosperou, “caducou” no jargão jurídico, já que não foi aprovada pelo Congresso e a matéria voltou a ser regida pelas normas pré-covid, fixadas pela reforma trabalhista de 2017.
Como ficaram as convenções e acordos travados antes, durante e depois da validade da Medida Provisória 927?
Quais são as atuais regras sobre banco de horas e compensação? Como fica o ajuste realizado no período pandêmico? Nos próximos parágrafos vamos esclarecer essas e outras dúvidas.
Banco de horas é um sistema de ajuste de jornada entre trabalhador e empregador, de modo a controlar a carga horária total de trabalho, para equilibrar as horas devidas (saldo negativo), ou as horas em haver (saldo positivo), com as horas efetivamente trabalhadas. O marco legal do sistema ocorreu em 1998 com a lei 9.601.
A dinâmica natural do banco de horas é que o trabalhador exceda a jornada comum de trabalho e depois troque esse excedente por folga ou por horas extras.
A compensação invertida foi uma medida de emergência que inverte essa dinâmica, no sentido de aproveitar a necessidade de isolamento social durante a pandemia por COVID-19, que afastou os trabalhadores da atividade, e utilizar esse tempo como horas devidas para a compensação em favor da empresa depois, ou seja, um banco de horas negativo que o trabalhador deverá resgatar.
Essas “horas extras não serão remuneradas porque se trata de compensação invertida, ou seja, trabalho após período de folga” (Coronavírus e os Impactos Trabalhistas, p. 63, Editora JH Mizuno. Edição do Kindle), portanto a hora devida nesse caso deve ser compensada por outra de igual valor, e não com o acréscimo da hora extra.
A partir do encerramento previsto para o estado de calamidade (01/01/2021 pelo decreto legislativo número 6), continua o autor, “os empregados deverão trabalhar duas horas extras diárias até compensarem as horas que não trabalharam em decorrência da pandemia”, isso tudo, é claro, se a empresa tiver instituído o banco de horas.
Dessa maneira, o que foi ajustado por oportunidade da MP 927/20 não perdeu a validade para regular os efeitos previstos até dia 19/07/2020, considerando que após essa data, a MP 927 perdeu a vigência e as regras anteriores sobre banco de horas retornaram com pleno vigor.
Como a medida provisória previa compensação em até 18 meses a partir de 01/01/2021, só atende a essa regra as horas estabelecidas até dia 19/07/2020. Enquanto isso, as horas inseridas após essa data obedecem integralmente à regra anterior, isto é, à reforma trabalhista de 2017 (compensação em 6 meses ou 1 ano).
Desde a reforma da legislação trabalhista, assinalada pela lei 13.467/17, o banco de horas opera com as seguintes nuances:
Muita atenção! O Poder Judiciário trabalhista entende que para os contratos de trabalho iniciados antes da reforma legal (antes de agosto de 2017), as mudanças não se aplicam, como por exemplo, a possibilidade de negociar o banco de horas individualmente entre empregador e funcionário (TRT 2ª região/ Mandado de Segurança nº 1001203-71.2018.5.02.0000).
Neste caso, o banco de horas seguirá as regras da MP 927 para as horas computadas até 19/07/2020, mas necessitará da intermediação do Sindicato para as demais horas inscritas a partir dessa data (somente acordo coletivo).
A grande vantagem trazida pelas regras do banco de horas da MP 927/20 foi o prazo maior para a compensação, que antes era de 6 meses ou 1 ano, e passou para 18 meses segundo a medida provisória, sendo que a compensação dessas horas somente se inicia a partir da data 01/01/2020.
Se essas horas não forem compensadas em 18 meses, o empregador pode negociar um tempo maior com o Sindicato ou realizar o desconto dos trabalhadores como última alternativa. Alexandra Cristina Cypriano (Coronavírus e os Impactos Trabalhistas, p. 61) nos adverte que:
“se a única opção for o desconto dos trabalhadores: (i) se forem trabalhadores com contrato de trabalho ativo, o ideal é que este desconto seja de forma parcelada para que não haja prejuízo ao trabalhador (trabalho sem remuneração em razão do desconto); (ii) se for em rescisão contratual, que este desconto seja feito com observância do limite legal para desconto [um salário do trabalhador em caso de rescisão contratual]”.
Como a medida provisória não prosperou, é inadmitido o desconto (banco de horas invertido) para as horas computadas após o dia 20/07/2020. Espera-se, contudo, que o Congresso nacional edite um decreto para regulamentar, com efeito, as relações estabelecidas durante a vigência da medida provisória, se isso não ocorrer a MP 927 produzirá efeitos para os estritos termos que tenha regulado enquanto durou (artigo 62, § 3º, § 11, Constituição Federal de 1988).
“Em caso de banco de horas negativo e rescisão, deve-se observar o regramento de cada convenção ou o que foi estipulado no acordo firmado para implantação do banco de horas” (Coronavírus e os Impactos Trabalhistas, p. 67).
O desconto rescisório de horas devidas pelo trabalhador, e não compensadas, está limitado a 70% do salário-base do trabalhador (pela Orientação Jurisprudencial 18 da SDC do Tribunal Superior do Trabalho e pelo artigo 477, §5º, CLT), além disso, se a compensação não ocorreu por motivo alheio ao empregado, impera a regra de que o desconto não possa ser efetuado por falta de oportunidade de compensação (Processo Nº RO-1002275-40.2015.5.02.0472).
Em relação às horas pela sistemática da MP 927/20, por exemplo, o prazo inicial de cumprimento da compensação dessas horas nem ao menos foi iniciado, dado que ainda vigora o estado de calamidade pública no país em razão da COVID-19. Por esse motivo, pode ser que eventuais descontos sobre acordos convencionados por essa medida sejam considerados ilícitos, provavelmente um argumento que será discutido em futuras ações judiciais.
Se a rescisão, por outro lado, foi por justa causa ou a pedido do empregado, sem nenhuma falta grave por parte do empregador, diante do não impedimento da lei o desconto pode ser realizado nas verbas rescisórias, principalmente as horas contratadas antes e após a vigência da MP 927/20.
Para facilitar o entendimento, observe a seguinte linha do tempo com a respectiva legislação de vigência para cada época no ano de 2020:
O contrato de trabalho não é atingido pela reforma, mas pode se sujeitar à MP | Julho 2017 Reforma Trabalhista |
O contrato de trabalho é atingido pela MP e na sua ausência, pela reforma trabalhista | 22/03/2020 início da MP 927/20 |
19/07/2020 prazo final da MP 927/20 | |
O contrato de trabalho não é atingido pela MP 927, mas responde pelas regras da reforma | 31/12/2020, fim do estado de calamidade. Decreto Legislativo 6/2020. |
É aconselhável que o trabalhador entre em contato com o sindicato de sua categoria para verificar eventuais acordos coletivos ou convenções mais benéficas, como a existência de um prazo maior de compensação das horas instituídas sob o mando da MP 927/20, além de se informar sobre as regras estipuladas para a categoria.
Por todos os pontos apresentados, tanto o trabalhador quanto o empregador podem reduzir o impacto dos prejuízos econômicos por meio de algumas nuances legislativas trazidas pelo estado de força maior da COVID-19.
É altamente recomendável que ao invés da rescisão, o empregador adote outros meios de contenção de despesas, disponibilizados por diversos instrumentos normativos, a exemplo dos benefícios emergenciais para a preservação do emprego e renda da lei 14.020/20 em favor do empresariado brasileiro.
Em caso de dúvidas, consulte um advogado trabalhista de sua confiança.
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