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Cobrança do ISS sobre a locação de bens imóveis

Muito se tem discutido a respeito da incidência do Imposto sobre Serviços (ISSQN) sobre receitas provenientes da locação de bens imóveis, cobrança que vem sendo aplicada por muitos municípios brasileiros.

Ainda que não haja pronunciamento dos tribunais superiores e que seja tímida a jurisprudência dos tribunais de Justiça do país, é patente a inconstitucionalidade da exigência do imposto para esse tipo de relação jurídica.

Como se sabe, os fundamentos para a cobrança de tributos devem ser analisados à luz da Constituição Federal, que determina a competência tributária de todos os entes da federação. O ISS encontra previsão legal no artigo 156, III, do texto constitucional, que estabelece que a prestação de serviços deve traduzir uma obrigação de fazer.

Isso significa que o que se tributa não é o serviço, mas, sim, a prestação do mesmo. No contrato de locação de bens imóveis, porém, o que ocorre é a cessão do bem locado ao locatário, o que se consubstancia em obrigação de dar, e não obrigação de fazer.

Ademais, também há de ser considerado que a prestação de serviços pressupõe o empenho de alguém na realização de atividades com conteúdo econômico, inexistente na locação de bem imóvel. Como bem adverte o professor e tributarista Kiyoshi Harada, a locação pura e simples de espaço de bem imóvel, sem envolver um trabalho criativo relacionado com festas, convenções e espetáculos, entre outros, não pode ensejar a tributação pelo ISS, cujo fato gerador exige o dispêndio de energia humana aplicada à produção de bem imaterial.

Esse entendimento, inclusive, já foi reconhecido no julgamento do Recurso Extraordinário 116.121, no qual o Supremo Tribunal Federal considerou que a locação de imóveis não pode ser qualificada como serviço. Ressalte-se o voto do ministro Celso de Mello, no qual defendeu que o ISS somente pode incidir sobre obrigações de fazer, a cuja matriz conceitual não se ajusta a figura contratual da locação de bens imóveis.

Assim, conclui-se que, pela inexistência de materialidade, a retribuição pecuniária recebida pela locação de imóvel próprio a terceiros não pode ser tributada pelo ISSQN. Consequentemente, a aplicação da Súmula Vinculante 31 do Supremo Tribunal Federal[1] deve ser estendida também para todo item 3 da Lei Complementar 116/2003 e seus subitens, já que compreendem “serviços” prestados mediante locação, cessão de direitos de uso e congêneres[2].


[1] Súmula Vinculante 31: “É inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis”.
[2] Marcelo Caron Baptista, na sua obra ISS, editora Quartier Latin, 2005, p. 334, assim se manifestou: “(…) Veja-se que todos esses bens podem ser simplesmente locados, sublocados, arrendados, como podem ser objeto de cessão de direito de passagem ou permissão de uso, sem o envolvimento de qualquer prestação de serviço. Nessa hipótese, descabe falar em incidência do ISS por se tratar de mera locação de bem imóvel, ou mesmo móvel (…) Quando alguém loca um salão de festas, por exemplo, sem contratar os serviços que normalmente lhe são disponibilizados, tais como os de garçom, de manobrista, de músico, de organização e de bufê, a relação é de locação de bem imóvel (…)”.

Tatiana Seda é advogada tributária e sócia do BGR Advogados.

Revista Consultor Jurídico

Ricardo de Freitas

Ricardo de Freitas possui uma trajetória multifacetada, ele acumula experiências como jornalista, CEO e CMO, tendo atuado em grandes empresas de software no Brasil. Atualmente, lidera o grupo que engloba as empresas Banconta, Creditook e MEI360, focadas em soluções financeiras e contábeis para micro e pequenas empresas. Sua expertise em marketing se reflete em sua obra literária: "A Revolução do Marketing para Empresas Contábeis": Neste livro, Ricardo de Freitas compartilha suas visões e estratégias sobre como as empresas contábeis podem se destacar em um mercado cada vez mais competitivo, utilizando o marketing digital como ferramenta de crescimento.

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