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Cobrança terceirizada: o que considerar ao contratar uma empresa de cobrança

Uma empresa de cobrança terceirizada atua na etapa da recuperação de créditos em atraso para credores, que são as empresas que concedem crédito aos seus clientes, podendo ser um crédito financeiro ou comercial. Quando credores observam atrasos nos pagamentos de seus clientes no departamento de contas a receber, contratar empresas de cobrança pode ser uma alternativa, mas que deve ser avaliada com cautela.

O ciclo de crédito compreende quatro etapas, a primeira etapa é a captação, do cliente e do capital para financiar a operação, a segunda é a concessão, momento em que os clientes passam pela avaliação de risco de crédito e são aprovados ou reprovados. Quando o cliente é aprovado e acessa o capital do credor, ou ganha prazo para pagamento de suas compras, o contrato do cliente passa para a terceira etapa do ciclo de crédito, dedicada à gestão do risco da carteira de crédito. A gestão do risco da carteira tem a função de assegurar que o credor não se exponha a perdas que possam prejudicar sua solvência. Para isso, além de zelar pelo controle efetivo dos riscos e assegurar que os mesmos são gerenciados de acordo com o nível de apetite de risco definido pela alta direção, deverá realizar uma revisão contínua das exposições ao risco de crédito. A quarta e última etapa é o momento em que o cliente não cumpre o compromisso financeiro e atrasa seu pagamento. É nesta última fase que as empresas de cobrança são eventualmente demandadas.

Entender o ciclo de crédito é importante, pois o cliente iniciou o relacionamento com o credor na etapa da captação, e por algum motivo relevante aquele credor ganhou a preferência sobre os demais. Significa dizer que há uma relação de afinidade e decisão de relacionamento do cliente com aquele credor. Após a aprovação, o cliente passa a interagir com a cultura do credor, sua abordagem, seu padrão de relacionamento e práticas de negócios.

Em grandes empresas, aspectos como governança corporativa, diretrizes de qualidade de atendimento ao cliente e o monitoramento das atividades por um grande número de interessados no negócio, conduz o relacionamento com os clientes e minimiza ações inadequadas e desalinhadas com os valores do negócio.

O padrão de relacionamento com clientes também está presente na etapa da cobrança e recuperação de créditos, para que o crédito seja recuperado e o cliente resgatado para novos negócios.

Conceitualmente, os primeiros dias de atraso nos pagamentos dos clientes definem o período de resgate do cliente e do capital, momento em que o credor se dedica a entender a situação do cliente e os motivos do atraso. O relacionamento ocorre envolto aos valores do credor, com a abordagem e ações em conformidade com as políticas internas.

Quando ocorrem atrasos de pagamentos em estágios mais avançados, acima de 60 dias, por exemplo, o credor passa a atribuir maior esforço na recuperação do crédito, uma vez que diversas interações são realizadas no período anterior sem ter como contrapartida o pagamento do cliente. É neste momento que as empresas de cobrança terceirizada são, frequentemente, demandadas.

O modelo de negócio de uma empresa de cobrança terceirizada é baseado na sua competência em recuperar créditos, materializada nas taxas de recuperação entregues aos credores. A remuneração paga pelos credores à empresa de cobrança é uma fração do valor pago pelo cliente devedor, logo, o racional de maximização do retorno financeiro do escritório não segue o racional do credor, havendo assimetria de interesses na concepção dos negócios.

Embora atualmente algumas empresas de cobrança busquem proporcionar uma relação baseada na melhor experiência para os clientes devedores, não dá para desconsiderar a necessidade de maximizar a rentabilidade do negócio através dos pagamentos dos clientes. Maximizar a rentabilidade na etapa da cobrança significa alcançar a maior volume de pagamentos com a menor despesa operacional. Isso faz com que muitas empresas atuem estrategicamente concentrando esforços de cobrança em determinados grupos de clientes, geralmente os de maior valor em atraso e com maior propensão ao pagamento. Além disso, as margens financeiras das empresas de cobrança são baixas, pois usam grande número de analistas de cobrança para realizar contatos e solicitar o pagamento pelos clientes, mesmo lançando mão de canais digitais para ações complementares. Ainda hoje, a cobrança realizada por analistas costuma ser a mais eficiente para muitos devedores, porém é a mais cara.

Este cenário tem como efeito derivado potencial o risco financeiro, o risco operacional e o risco de reputação para o credor. O risco financeiro aparece quando o escritório busca maximizar o retorno financeiro dele e não do credor, deixando, muitas vezes, de cobrar determinados clientes. O risco operacional e o de reputação caminham juntos, pois correspondem a qualidade do relacionamento entregue aos clientes. Os analistas de cobrança dos escritórios não atuam sob os valores e diretrizes do credor, portanto, ainda que eles queiram oferecer a melhor experiência, há uma limitação natural para que eles não falem a língua do credor. O resultado pode ser a insatisfação do cliente gerada pela abordagem, afetando a geração de novos negócios, as reclamações e, no limite, as demandas judiciais.

Para ter uma dimensão dos possíveis problemas, basta pesquisar na internet as reclamações sobre a atuação dos escritórios de cobrança, em poucos segundo é possível encontrar milhares de resultados de clientes insatisfeitos pela realização de cobranças indevidas e outros problemas.

Entendendo e controlando os potenciais riscos, contar com parceiros de cobrança terceirizada pode ser importante, afinal há empresas que realizam trabalho sério e comprometido com a qualidade do atendimento. Para controlar os riscos, o credor deve usar ferramentas de gestão no departamento de contas a receber que permitem, em tempo real, monitorar as ações dos escritórios, comparar resultados, controlar restritivos cadastrais, e verificar o engajamento dos analistas nos escritórios. Além disso, quando o credor tem o controle das atividades realizadas nas terceirizadas, ele pode ajudar a empresa de cobrança a entregar mais resultado fortalecendo a parceria e reduzindo a rotatividade nos processos de meritocracia.

Por fim, a gestão eficiente do contas a receber pelo credor leva a uma menor quantidade de clientes terceirizados para as empresas de cobrança, concentrada em clientes de menor potencial de pagamento e de geração de novos negócios com o credor.

*Por Pedro Bono, CEO da Receiv e professor de gestão e análise de carteiras de crédito na FGV

Wanessa

Redação Jornal Contábil

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