A Coca-Cola se tornou manchete na Folha de S. Paulo após ameaçar deixar a produção na Zona Franca de Manaus, caso o presidente Michel Temer não reconsidere a redução do IPI (Imposto de Produtos Industrializados) de 20% para 4% para o setor de bebidas, medida aprovada após acordo com caminhoneiros.
De acordo com reportagem, a Coca-Cola pede ao governo que a alíquota do tributo fique em 15%. Mas, como uma redução de um tributo é criticada por gigantes do setor? O HuffPost Brasil explica como o caso da Coca-Cola e de outras multinacionais de refrigerantes é muito mais complicado do que parece.
Em julho, o Senado aprovou uma redução da alíquota de IPI para fabricantes de refrigerantes. A medida defendida por Temer diminui de 20% para 4% o tributo sobre o extrato concentrado que é usado na fabricação de refrigerantes.
Agora a Coca-Cola pressiona o governo para a alíquota ficar em, pelo menos, 15%, e não 4%. Segundo a companhia, a operação “estaria comprometida.”
Se Temer não atendesse o pedido, a empresa ameaçou mudar a produção para outro país da América do Sul. Em caso de saída do Brasil, a Coca-Cola prevê um aumento de preço de cerca de 8% no refrigerante para o consumidor, impactado pela importação do concentrado do refrigerante.
Na teoria, a redução do IPI seria bem-vinda para qualquer setor de produção do Brasil. A grande questão é que a Coca-Cola, a Brasil Kirin, a Ambev, entre outras gigantes do setor, não gostaram nada dessa diminuição no imposto, pois ela resultaria em um custo maior.
Acontece que a produção do concentrado dos refrigerantes fica na Zona Franca de Manaus e, por lei, as fabricantes recebem isenção do IPI na venda do produto para seus envasadores. A isenção é convertida em um crédito tributário proporcional que pode ser usado para abater outros tributos, como CSLL (Contribuição Social Sobre Lucro Líquido).
Ou seja, as empresas direcionam esse “bônus” para pagar outros tributos. Com a redução do IPI de 20% para 4%, as empresas teriam menos crédito para repassar para outros tributos. Sem esses benefícios, a margem de lucro tende a ser menor. Só em 2016, o setor gerou R$ 2 bilhões em créditos na região.
As isenções e benefícios da Zona Franca de Manaus também vêm chamando atenção da Receita Federal, que investiga possíveis manobras das fabricantes para pagar menos impostos.
Em março deste ano, a Receita Federal afirmou que grandes empresas do setor se aproveitam de benefícios fiscais oriundos de insumos de baixo valor agregado. “Entre os insumos que geram créditos para fabricantes de bebidas, incluem-se até mesmo substâncias que são adquiridas no centro do País e passam por simples reacondicionamento em Manaus”, observou a Receita em nota.
A Receita também investiga a suspeita de que a Coca-Cola tenha usado suas vantagens fiscais para superfaturar a venda de seu concentrado para os envasadores.
“Pelas regras tributárias em vigor até maio, a cada R$ 100 vendidos em concentrado, os envasadores geravam R$ 20 em créditos fiscais”, explica a reportagem da Folha. Executivos terão que esclarecer por que a Coca-Cola vende o quilo do concentrado por aproximadamente R$ 200 — o que gera um crédito tributário proporcional —, se o produto é exportado por cerca de R$20 o quilo.
O ponto, segundo os investigadores, é que a maioria dos engarrafadores pertence à Coca-Cola e, sendo assim, os valores inflados trariam maiores “bônus fiscais”.
A Afrebras (Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil) também denunciou a Coca-Cola e outras gigantes do setor de utilizarem créditos tributários de forma indevida, fazendo operações que não se enquadram nas isenções e nas transferências de crédito do Polo Industrial de Manaus.
Segundo nota da associação elaborada em maio, em meio à greve dos caminhoneiros, a tributação das fábricas de concentrados na Zona Franca de Manaus é “o maior gargalo da indústria de bebidas nacional”. A soma da renúncia fiscal com os créditos tributários chegaria ao valor de R$ 9,1 bilhões ao ano, estima a entidade.
“Graças aos bilhões em créditos de impostos que as multinacionais acumulavam com a produção de concentrado na Zona Franca de Manaus, os pequenos fabricantes acabavam pagando, proporcionalmente, mais impostos que as gigantes do setor”, afirmou a Afrebras.
A redução do IPI, prometida pelo governo, resultaria, portanto, em um maior equilíbrio no setor de bebidas, que enfrenta uma séria crise “devido à unilateralidade dos incentivos concedidos”.
“Para se ter noção, 160 fábricas de refrigerantes fecharam de 2006 a 2016. Nessa conta, mais de 7 mil empregos diretos foram perdidos”, diz a Afrebras em nota. “Ao reduzir esses créditos [com a redução do IPI], o governo federal, baseado em estudos técnicos da Receita Federal, garantiu R$ 740 milhões em arrecadação até o fim de 2018 e maior equilíbrio tributário no setor de bebidas.”
As isenções fiscais para a produção na Zona Franca de Manaus foram defendidas pela Abir (Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas). Ela considera que levar empresas a desenhar ciclos econômicos em região de difícil logística “parecia algo impossível de ser realizado” sem os incentivos.
“A presença de um polo de fábricas de concentrados em Manaus estimula o crescimento da agricultura regional, principalmente o extrativismo das diversas frutas típicas, como o guaraná e o açaí. Além disso, há ainda o fomento de dezenas de empresas-satélites, fornecedoras de matérias-primas, materiais de embalagem e outras. O resultado disso tudo é a geração de ao menos 15 mil empregos diretos e indiretos no raio de influência da ZFM [Zona Franca de Manaus]”, afirma a Abir em posicionamento publicado nesta terça-feira (21).
A mudança “brusca” no regime tributário de compensações fiscais, continua a associação, ameaça os investimentos e as operação das 31 indústrias de concentrados de refrigerantes instaladas, que recolhem anualmente mais de R$ 10 bilhões em tributos.
“Sem o modelo ZFM, sem o ponto de equilíbrio, o impacto é global”, considera.
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Após repercussão, a Coca-Cola informou que não tem planos de deixar Manaus.
“Reiteramos que a Coca-Cola Brasil não tem planos de deixar a Zona Franca de Manaus, de onde há 28 anos sai o concentrado utilizado na produção de várias de nossas bebidas pelas 36 fábricas instaladas no País. Nosso compromisso com o Brasil é sólido e de longo prazo, numa trajetória que já soma 76 anos”, disse em nota. “Não trabalhamos com ameaças.”
À Folha, a empresa também negou as supostas irregularidades investigadas pela Receita e informou que atua “sempre em cumprimento com a legislação em vigor, comprovada por auditorias externas anuais e dos órgãos concessores”, diz em nota.
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