O direito à saúde é um pilar fundamental da Constituição brasileira, assegurando a todos os cidadãos o acesso a serviços de saúde pública e gratuita por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, esse direito enfrenta desafios significativos quando se trata do fornecimento de medicamentos de alto custo.
A crescente demanda por tratamentos inovadores, frequentemente acompanhados de preços elevados, tem intensificado a chamada “judicialização da saúde”. Esse fenômeno ocorre quando o Poder Judiciário intervém para garantir que o Estado — seja em nível federal, estadual ou municipal — forneça medicamentos e tratamentos que, em muitas ocasiões, não estão contemplados nas diretrizes do SUS. Este cenário suscita uma análise detalhada das questões jurídicas envolvidas, além das controvérsias e possíveis soluções para este dilema.
De acordo com o artigo 196 da Constituição, “a saúde é direito de todos e dever do Estado”, incluindo implicitamente o fornecimento de medicamentos essenciais para a vida e saúde dos indivíduos. Com essa base legal, muitos cidadãos têm buscado a Justiça para obter medicamentos que não figuram nas listas oficiais do SUS.
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Decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm reforçado a obrigação do Estado em assegurar o fornecimento de medicamentos quando há comprovação da necessidade, urgência e ausência de alternativas na rede pública. Essas decisões indicam que o direito à saúde vai além dos medicamentos padrão disponibilizados pelo SUS, abrangendo também aqueles considerados indispensáveis para os pacientes.
O fenômeno da judicialização da saúde apresenta duas faces principais: um impacto significativo no orçamento do SUS e um desafio jurídico complexo. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) indicam que as ações judiciais relacionadas a medicamentos não padronizados geram um ônus financeiro expressivo ao governo. O aumento nas solicitações judiciais para medicamentos fora dos protocolos estabelecidos tem pressionado as finanças públicas, forçando o Estado a realizar aquisições emergenciais e custosas.
A Advocacia-Geral da União (AGU) aponta que muitos dos medicamentos demandados carecem de registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), resultando em um impasse legal. O STF estipula que, salvo exceções comprovadas, o Estado não é obrigado a fornecer medicamentos ainda não registrados pela Anvisa. Consequentemente, laudos médicos e evidências da eficácia dos tratamentos tornaram-se requisitos comuns nos processos judiciais.
Outro ponto importante é o “efeito multiplicador” dessas ações judiciais: uma decisão favorável pode incentivar outros cidadãos com necessidades semelhantes a buscar medidas legais idênticas, aumentando assim o impacto financeiro sobre o Estado. Esse fenômeno ressalta a necessidade de uniformizar entendimentos jurídicos e criar abordagens que contemplem as demandas coletivas, em vez de apenas atender aos pedidos individuais.
Os tribunais superiores têm trabalhado para estabelecer diretrizes claras quanto à judicialização envolvendo medicamentos de alto custo. Um marco importante foi o julgamento do RE 566.471/RN pelo STF, que definiu que o Estado não é obrigado a fornecer medicamentos experimentais ou sem registro na Anvisa, exceto em casos comprovadamente urgentes e com apresentação de laudo médico. Essa decisão orienta tribunais em todo o país e tem contribuído para reduzir a quantidade de ações judiciais.
Além disso, no Tema 793 do STF foram estabelecidos critérios mais rigorosos para o fornecimento de medicamentos não incorporados ao SUS. Para que um medicamento fora da lista oficial seja fornecido, deve-se comprovar sua imprescindibilidade, ausência de alternativa terapêutica padronizada e a incapacidade financeira do solicitante para adquiri-lo.
Essa perspectiva também foi ratificada no STJ no REsp nº 1.657.156/RJ (Tema 106 dos Recursos Repetitivos), onde foram reiterados os requisitos necessários: comprovação da imprescindibilidade do medicamento, incapacidade financeira do paciente e registro na Anvisa.
Diante desse contexto desafiador, várias soluções estão sendo propostas para melhorar o acesso aos medicamentos de alto custo. É essencial equilibrar os direitos dos pacientes com as limitações orçamentárias do sistema público.
Em resumo, assegurar o acesso a medicamentos caros é crucial, mas requer uma avaliação cuidadosa dos limites dessa obrigação estatal. A judicialização representa uma resposta às lacunas existentes no sistema público de saúde; no entanto, deve ser vista como uma solução temporária e não uma prática regular. É imperativo unir esforços entre Judiciário, Legislativo e Executivo para desenvolver soluções estruturais que atendam às necessidades da sociedade como um todo.