A Reforma Trabalhista alterou significativamente o entendimento relativo às horas decorrentes do tempo de deslocamento do empregado de sua residência até o trabalho e do trabalho de volta para casa, chamadas de horas in itinere.
Para que seja possível adentrar no assunto é preciso, inicialmente, esclarecer o conceito de “tempo à disposição”, previsto no artigo 4º da Consolidação das Leis do Trabalho, que expõe:
Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada.
Pois bem, em 2001, a Lei nº 10.243, de 19 de junho, incluiu o parágrafo 2º no artigo 58 da CLT, na Seção dedicada à Jornada de Trabalho, com a seguinte redação:
O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução.
Da leitura se pode concluir que o empregado que residia em local de difícil acesso, sem outros meios de locomoção que lhe possibilitassem cumprir o horário de trabalho e que utilizava o transporte fornecido pela empresa, se tratava de caso de exceção, sendo o período despendido no trajeto computado como horas de trabalho.
Com a modificação em consequência da Lei nº 13.467/2017 o referido parágrafo passou a dispor que:
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O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)
A Reforma Trabalhista, aparentemente, portanto, excluiu qualquer possibilidade de incluir horas in itinere na jornada de trabalho.
Nesse mesmo sentido, foi revogado o parágrafo terceiro do artigo 58, que possibilitava às empresas de pequeno porte ou microempresas a fixação de tempo médio de locomoção e a forma e natureza da remuneração, em casos de transporte fornecido pelo empregador, quando for local de difícil acesso ou em não havendo transporte público.
No entanto, a doutrina e a jurisprudência vêm demonstrando que não é possível interpretar referidas normas de forma literal, no sentido de que o início da jornada de trabalho se daria, tão somente, no momento em que o funcionário efetivamente se põe no posto de trabalho.
Nos casos de discussão sobre horas in itinere a jurisprudência aplica o parágrafo 2º do artigo 58 da CLT em conjunto com os incisos da Súmula nº 90 do Tribunal Superior do Trabalho, que dispõem:
Em decisão recente fixando essa linha de raciocínio ficou consignado que:
Cediço que são requisitos básicos para o pagamento das horas in itinere: a utilização pelo empregado de transporte fornecido pelo empregador, e local de difícil acesso ou não servido por transporte público regular, exigidos tanto pela jurisprudência (Súmula 90, do TST), quanto pelo comando legal (art. 58, §2º, da CLT). (RRAg-1543-30.2014.5.05.0019, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 01/07/2020).
Outrossim, o ônus da prova a fim de comprovar o direito ao valor correspondente às horas in itinere é do reclamante, à semelhança do disposto no artigo 373 e incisos do Código de Processo Civil, na forma do artigo 818 da CLT:
O ônus da prova incumbe:
Do exposto, extrai-se que a reclamada tem o condão de comprovar a existência de transporte público regular e que seja compatível com a jornada de trabalho do empregado ou a facilidade de acesso ao local de trabalho.
Além disso, é pacífico que o transporte alternativo não é, juridicamente, considerado transporte público regular, como em casos de vans alternativas, e, por isso, não afasta o direito às horas in itinere.
Outro ponto importante a se destacar é que o pagamento do valor decorrente do tempo de locomoção é computado como horas de trabalho somente se houver habitualidade.
Por fim, em sendo comprovadas as horas in itinere haverá reflexos nas horas de trabalho e horas extras, assim como no tempo devido de intervalo intrajornada.
O entendimento acerca do tempo de locomoção do empregado até seu trabalho interfere não só na esfera trabalhista, mas na área previdenciária, no que se refere, por exemplo, à concessão do auxílio-acidente.
O auxílio-acidente é um benefício concedido pelo artigo 18, inciso I, alínea h da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, que trata dos Planos de Benefícios da Previdência Social:
O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
I – quanto ao segurado:
h) auxílio-acidente;
A Medida Provisória nº 905 de 2019, que instituiu o chamado Contrato Verde e Amarelo, mudou o entendimento de que acidentes de percurso até o trabalho ou do trabalho para casa seriam considerados acidentes de trabalho, sob fundamento de que a Reforma Trabalhista teria excluído as horas in itinere.
Para isso, a MP revogou o artigo 21 da Lei 8.213, que equiparava ao acidente de trabalho o acidente de trajeto
“d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado”.
Com a revogação da MP 905 pela MP 955, publicada em 20 de abril de 2020, entretanto, a alínea d voltou a viger, o que, por sua vez, interferiu no direito previsto no artigo 118 da mesma Lei, que menciona:
O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente.
à estabilidade provisória após seu retorno ao trabalho se ficar afastado por mais de 15 dias em caso de acidente de trajeto.
Assim, foi devolvido ao empregado, também, o direito à estabilidade provisória, no caso de acidente de percurso equiparado a acidente de trabalho.
Por: Elen Moreira, Advogada especialista em Direito Público. Conciliadora e colaboradora do CEJUSC/TJSC. Membro da Comissão da Mulher Advogada e da Comissão de Políticas de Combate às Drogas.
Fonte: Instituto de Direito Real
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