PRESUNÇÃO DE CULPA: Direito Tributário é mais duro com acusados do que o Penal

Embora tenha diversos princípios em comum com o Direito Penal, o Direito Tributário trata os infratores de forma mais rígida do que aquele ramo. Essa é a opinião de Luiz Gustavo Bichara, sócio do Bichara Advogados. Em sua palestra na quinta-feira (24/9) no XIX Congresso Internacional de Direito Tributário, organizado pela Associação Brasileira de Direito Tributário (Abradt) em Belo Horizonte, ele afirmou que o direito de defesa dos contribuintes só vai ser valorizado se o processo tributário for mais influenciado pelas garantias do processo penal.

E a área fiscal que mais precisa se basear no modelo criminal é a das sanções, avaliou o tributarista. Segundo ele, há dois aspectos que tornam as excessivamente severas as punições aos contribuintes infratores. O primeiro é a não centralização das regras na União, o que autoriza estados e municípios a estabelecer suas sanções, muitas vezes sem se importar se são rígidas demais. Já o segundo é a multiplicidade de normas penalizantes sobre uma mesma conduta, que submete o autor de um único ilícito fiscal a diversas multas, sem absorção delas pelo princípio da consunção.

Um princípio que deveria inspirar mais o Direito Tributário é o da presunção de inocência, analisou Bichara. “No processo penal, o acusado é considerado inocente até o trânsito em julgado. No processo tributário, acontece o contrário: no início da lide o contribuinte já é considerado culpado, e isso é validado pelo Judiciário. Por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça autoriza a expropriação de bens no início da execução. Isso mostra que a jurisprudência está na vanguarda do retrocesso.”

A Medida Provisória 685/2015, que instituiu a obrigação de pessoas e empresas declararem seus planejamentos ficais à Receita Federal, é uma clara demonstração dessa inversão, argumentou o advogado. De acordo com ele, a presunção de dolo do artigo 12 da norma viola a presunção de inocência do contribuinte.

Escalada do punitivismo
O Brasil assiste a uma escalada do punitivismo, estimulada pela espetacularização do processo penal. E isso fere garantias constitucionais e o Estado Democrático de Direito, alegaram os criminalistas Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, e Marcelo Leonardo em suas palestras no evento.

Para Kakay, essa onda está enfraquecendo a advocacia e as prerrogativas da profissão. E sem garantias básicas, como o acesso a acusações e o conhecimento de decisões judiciais, os procuradores não conseguem fazer mais do que um “simulacro de defesa” aos seus clientes. Pior: os advogados passam a ser vistos pela população como entraves exercício da Justiça, destacou o criminalista.

Ele também criticou as medidas de combate à corrupção lançadas pelo Ministério Público Federal: “Essas propostas de endurecimento do processo penal visam pegar os milionários, mas eles esquecem que a lei é para todos. Assim, ao recrudescê-la, recrudesce para todos, e quem mais sofre são os pobres, que não têm acesso a bons advogados”.

Já Marcelo Leonardo, que também é professor da Universidade Federal de Minas Gerais, disse que o surgimento das grandes operações da Polícia Federal, a partir de 2003, teve como consequência o aumento do uso de meios ocultos de prova, muitas vezes usados sem autorização judicial ou com aprovação irregular. Algumas dessas formas são a escuta telefônica, o agente infiltrado, a delação premiada e a espionagem noturna e sigilosa.

De acordo com o especialista em Direito Penal, essas medidas só podem ser usadas se respeitarem garantias constitucionais, como direito à privacidade, inviolabilidade do domicílio, contraditório e ampla defesa, tiverem permissão judicial, e se forem essenciais para o processo e previstas em lei. Caso contrário, as provas obtidas por esses meios serão ilícitas, garantiu Marcelo Leonardo.

Sérgio Rodas é repórter da revista Consultor Jurídico.

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