Quando pequena, lembro da minha querida avó, Dona Amália, usar uma expressão muito interessante: “uma no cravo, outra na ferradura”.
Ela explicou que os ferreiros precisam prender ferraduras no casco dos cavalos com pregos especiais – os cravos.
Para tornar o procedimento menos penoso, o ferreiro dava algumas marteladas na ferradura, o que não causava dor, outras no cravo, e com esse método progressivamente fixava a ferradura, sem assustar o animal.
O velho ditado se aplica às situações em que ações boas e ruins se alternam.
As notícias mais recentes sobre a reforma tributária me remeteram ao velho ditado usado por minha avó.
A economia se anima com a notícia de que a folha de pagamento de vários setores será desonerada.
Esse pleito é justo e antigo.
Depois de muita pressão do empresariado, finalmente, está em vias de ser atendido.
É fato: essa desoneração é tão bem-vinda quanto necessária.
Atenuar os indesejáveis encargos tributários sobre a folha de pagamento colabora com a manutenção de empregos e contratação de funcionários.
Em tempos de pandemia, o entendimento simplista de que só sofrem no Brasil os empregados foi colocado em xeque.
O número crescente de empresas de vários portes e prestadores de serviços encerrando suas atividades trouxe luz a uma fórmula óbvia: sem empregadores, não há empregos.
Todos perdem.
Nem deu tempo de comemorar, já vem a martelada no cravo: um projeto de lei referendado pela equipe econômica de Paulos Guedes que pretende encontrar uma nova fonte de arrecadação.
O lado bom: a proposta simplifica a tributação brasileira, unificando alguns tributos, incidindo sobre valor agregado cobrado nas transações de bens e serviços.
O lado ruim: o tributo incidiria também sobre pagamentos eletrônicos.
Justamente agora, quando são dados importantes passos pelo Banco Central do Brasil para a implementação do sistema instantâneo de pagamentos.
O Ministro defende que não se trata de retirar da tumba a CPMF, a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, que ficou tempo demais em vigor.
Não haveria incidência sobre saques e depósitos bancários.
Realmente, isso não combina com valor agregado.
De todo modo convém aguardar para saber onde será dada a próxima martelada: no cravo ou na ferradura.
Por: Thaís Cíntia Cárnio, Professora de Direito Empresarial e Mercado Financeiro da Universidade Presbiteriana Mackenzie.