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Refis – Justiça permite que recuperando escolha como pagar

 

Uma empresa que entrou com pedido de recuperação judicial poderá pela primeira vez escolher a melhor forma de parcelamento de seus débitos tributários.

Na avaliação do juiz Marcelo Barbosa Sacramone, da 2ª Vara de Falências e Recuperação Judicial de São Paulo, ao tomar a via da recuperação judicial a empresa deve receber o tratamento mais benéfico possível, ao mesmo tempo em que o Fisco não seja prejudicado – uma vez que a Lei de Recuperação Judicial e Falências concede tratamento privilegiado à Receita.

Com a interpretação inédita, do dia 27 de abril, o juiz homologou o plano de recuperação da empresa Blue Bird Participações S.A, controladora do Grupo Gep, dono das marcas Luigi Bertolli e Cori. Cabe recurso da decisão.

“Embora não haja mais justificativa para que os débitos tributários não sejam pagos ou parcelados”, segundo o juiz Marcelo Barbosa Sacramone, a Lei 13.043/14, que reabriu o Refis com prazo de 84 meses “não é condizente ao tratamento exigido pelos empresários em recuperação judicial”.

Além do prazo, “a exigência de renúncia à pretensão deduzida em juízo questionando o tributo cria tratamento desigual entre os diversos credores e afronta os dispositivos constitucionais, de modo que deve ter a incidência afastada.”

“Nos termos do art. 155-A, do Código Tributário Nacional, diante da ausência de lei específica, aplicam-se à recuperanda as normas gerais de parcelamentos do ente da Federação”, escreveu o juiz. “Considerando o tratamento privilegiado às empresas em crise, que devem ter tratamento mais benéfico do que outras de qualquer ramo de atuação, às recuperandas deverá ser permitido a adoção do melhor parcelamento existente.”

O art. 57 da Lei de Recuperação Judicial (11.101/05) exige a apresentação de Certidão Negativa de Débitos (CND), ou seja, um documento que atesta que a empresa está em dia com o Fisco, para que o plano de recuperação seja homologado pela Justiça. É no plano que constam os valores, prazos, prioridades e nomes dos credores. Ao homologar o plano, o Judiciário sanciona um “plano de vôo” para que a empresa resolva os passivos e consiga retomar normalmente as suas operações – objetivo maior da Lei de Recuperação Judicial.

O que vinha acontecendo em alguns casos era, porém, que a execução fiscal continuava, a ponto de o Fisco penhorar algum ativo da empresa, ação que, na avaliação de juristas, dificultava a recuperação judicial, levando, em alguns casos, a empresa à falência.

Ao eliminar a possibilidade de que a empresa em recuperação vendesse um ativo, a execução fiscal indiretamente prejudicava o plano e os demais credores da pessoa jurídica em um momento delicado de tentativa de retomada das suas atividades.

A decisão da 2ª Vara de Falências pode representar incentivo relevante para que empresas em recuperação judicial busquem um parcelamento mais favorável ao atual. No ano passado, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o presidente Michel Temer (PMDB) estabeleceram um dos programas de parcelamentos mais rigorosos dos últimos anos – desde a década de 1990. A União, sob protestos da Receita Federal, permanentemente oferece programas de parcelamento de dívidas para empresas.

O governo enviou ao Legislativo a Medida Provisória do novo Refis (MP 766) sem previsão de desconto de multa e juros. Mas, no início de maio, a comissão especial que analisa a MP no Congresso concedeu uma série de benefícios, como parcelamento de 240 meses e descontos de 90% em multas e juros para pagamentos à vista de débitos. Os parlamentares autorizaram ainda a adesão de empresa em recuperação no novo Refis.

Neste ponto, o precedente da Blue Bird pode levar empresas a buscarem no Judiciário a permissão para aderir a outros parcelamentos, diferentes do  Programa de Regularização Tributária (PRT) estabelecido pela MP 766,  justamente por ter este as regras mais rígidas dos últimos anos – critérios mais benéficos poderiam enfraquecer ainda mais os cofres públicos.

Segundo Matheus Bueno de Oliveira, sócio do PVG Advogados e especialista em tributário, uma leitura mais restritiva indicaria que empresas em recuperação só poderiam aderir ao PRT.

Como as recuperandas já poderiam aderir ao PRT sem necessidade de autorização judicial, uma leitura possível seria a de que estaria sendo concedido o direito de adesão a qualquer parcelamento já concedido, ainda que seu prazo de opção legal já esteja encerrado”, assinalou. “Essa leitura mais benéfica seria certamente muito criticada pela Fazenda, mas estaria seguindo o espírito de conservação da empresa em recuperação.”

Leia na íntegra a decisão

Recuperação e CND

Ao tentar equilibrar a necessidade de permitir que empresas evitem a falência e voltem a gerar empregos e riquezas, o Judiciário vinha se posicionando pela suspensão da execução fiscal nos casos em que a empresa apresentasse a CND.

Em importante precedente, o ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça, decidiu nesta linha (Resp 1.512.118/SP). Mas, nos casos de planos de recuperação sem a apresentação da CND, “a execução fiscal terá regular prosseguimento, pois não é legítimo concluir que a regularização do estabelecimento empresarial possa ser feita exclusivamente em relação aos seus credores privados, e, ainda assim, às custas dos créditos de natureza fiscal”.

Quando houver a necessidade de se prosseguir com a cobrança pelo Fisco dos tributos devidos, na ausência de CND, no entanto, o ministro Herman Benjamin escreve que “seja qual for a medida de constrição adotada na Execução Fiscal, será possível flexibilizá-la com base nas circunstâncias concretas”.

No caso concreto da Blue Bird, o juiz Marcelo Barbosa Sacramone considerou que é preciso levar em conta o parcelamento de tributos e a flexibilidade da execução fiscal sob o risco de a recuperação judicial não cumprir os objetivos desejados.

“Sem parcelamento fiscal, nesses termos, ou se comprometeria a própria recuperação judicial, com a possibilidade de constrição de ativos submetidos ao plano, ou se provocaria o contrassenso de se prejudicar o Fisco, tratado favoravelmente pela legislação”, escreveu.

Em outras palavras, a participação no programa de parcelamento representa uma necessidade vital para a empresa, mas ao mesmo tempo ela não poderia ser prejudicada por critérios e parâmetros mais rígidos.

A interpretação do magistrado visa equilibrar justamente o privilégio de créditos ao Fisco com a necessidade de a empresa voltar a caminhar com as próprias pernas.  “Imprescindível que se obtenha uma solução adequada para que os débitos tributários sejam estruturados”, assinalou.

Na avaliação do advogado Fabio de Almeida Braga, sócio da Direito Bancário e Societário do escritório Demarest, a decisão de Sacramone tenta “harmonizar” o interesse da recuperanda e o pagamento dos débitos fiscais.

“[O juiz] Determinou uma condição para validade da decisão que, até em 120 dias, a empresa recuperante apresente uma comprovação de que ela conseguiu fazer o parcelamento da melhor forma possível”, disse Braga.

Quem concorda com Fabio Braga é o ex-juiz federal Luciano Godoy, sócio da área Cível do PVG Advogados. Na sua avaliação, a decisão do juiz foi “correta”, “justa” e “acena com a lei”.

“A empresa é fonte de geração de empregos, riqueza, renda, e, com isso, pagamento de tributo; até para o Fisco, a empresa ir a falência, parar de produzir, é péssimo”, avaliou Godoy.

Credibilidade à RJ

Os advogados Rodrigo Tellechea e Natália Mariani, da área de Reestruturação e Insolvência do Souto Correa, avaliam que, caso outras varas do Judiciário adotem o mesmo entendimento de Sacramone, isso “permitirá o aumento da credibilidade da recuperação judicial perante os credores e outorgará maior seriedade ao procedimento recuperatório”.

“Registre-se, no entanto, a necessidade de o Congresso Nacional revisitar o tema, que é de extrema relevância para a recuperação econômica do país, para fins de estender o prazo para pagamento dos débitos tributários”, apontam os advogados. Via Jota

Ricardo de Freitas

Ricardo de Freitas possui uma trajetória multifacetada, ele acumula experiências como jornalista, CEO e CMO, tendo atuado em grandes empresas de software no Brasil. Atualmente, lidera o grupo que engloba as empresas Banconta, Creditook e MEI360, focadas em soluções financeiras e contábeis para micro e pequenas empresas. Sua expertise em marketing se reflete em sua obra literária: "A Revolução do Marketing para Empresas Contábeis": Neste livro, Ricardo de Freitas compartilha suas visões e estratégias sobre como as empresas contábeis podem se destacar em um mercado cada vez mais competitivo, utilizando o marketing digital como ferramenta de crescimento.

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