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Reforma tributária: Os princípios liberais parecem ter sido deixados de lado!

Nos tempos de hoje, em função dos extremismos do debate, pouco podemos refletir sobre as reformas necessárias, o que é possível do ponto de vista do consenso democrático e as atuais propostas em curso.

No que se refere à reforma tributária não é diferente.

Não se pode cair em nenhuma das pontas das ideologias que perpassam a opinião pública, sob o risco de se jogar o “bebê junto à água da bacia”.

A reforma não se reduz a aumentar a carga tributária sobre os mais ricos e a taxar grandes fortunas – como a panaceia das questões fiscais – nem ao mote “imposto é roubo” – onde quaisquer discussões reais acerca de impostos e das necessidades de financiamento do setor público são desconsideradas.

Quatro são os pilares do diagnóstico de bom-senso:

(1) A carga tributária é elevada para o nível de renda per capita e qualidade do gasto e dos serviços públicos no Brasil;

(2) União, Estados e Municípios estão “quebrados” (problema estrutural agravado pelo ciclo populista dos gastos públicos pós-crise de 2008 e pela pandemia de 2020), ou seja, não é possível reduzir a carga tributária total no curto prazo;

(3) A distribuição do ônus tributário é considerada injusta (penaliza de forma regressiva os mais pobres – por conta da elevada participação dos impostos sobre o consumo – e alguns segmentos da cadeia produtiva);

(4) A forma e a estrutura de incidência e de arrecadação geram ineficiências e criam incentivos para informalidade e decisões empresariais de baixa produtividade).

Qualquer proposta crível de Reforma Tributária deveria tratar, de alguma forma, desses quatro elementos.

Na perspectiva do liberalismo clássico, um sistema tributário deve ser o mais neutro possível sobre a atividade econômica e deve onerar ao mínimo possível os cidadãos. Deve evitar uma profusão de tributos e de alíquotas.

Ademais, não pode ser complexo, deve ser simples, claro e objetivo – não deve tomar muito tempo de indivíduos e empresas no ato do recolhimento/pagamento. Adicionalmente, o sistema tem que permitir a descentralização e o federalismo fiscal.

Na prática isso significa que uma proposta de Reforma Tributária deve buscar simplificar e racionalizar a estrutura de tributos (evitando a “tributação em cascata”), revogar portarias e procedimentos administrativos que tornam complexo o pagamento de impostos e contribuições (como as chamadas “obrigações acessórias”), desonerar ao máximo a produção de bens e serviços e distribuir o ônus tributário sem privilegiar qualquer setor ou segmento em específico.

Já a questão da carga tributária não depende apenas das propostas relacionadas ao tributos, pois é apenas um lado da equação.

O outro é o lado da despesa pública – que necessita de uma profunda reforma administrativa (que vai além das questões de carreiras públicas e recursos humanos) e que deveria abarcar questões do processo orçamentário, avaliação de eficiência do gasto público etc.

Se não houver contenção e redução do gasto público, nem redução do endividamento público (composto por um amplo e ousado programa de privatizações), não haverá como ser reduzida a carga tributária.

Infelizmente, até o momento, o Governo Federal não deu sinais de que abraçou a causa de fato. Muito foi falado pelo Ministro Paulo Guedes às vésperas de assumir seu posto no Ministério da Economia.

Alíquotas uniformes de 15% de impostos de renda, privatizações, choque de gestão etc. Todavia, uma vez empossado, apenas a reforma previdenciária – recheada ainda de privilégios – foi entregue. A proposta de reforma tributária foi “fatiada” e está sendo entregue a conta gotas.

O que está colocado agora pelo Executivo é a unificação do PIS/COFINS sob a forma de um tributo sobre valor adicionado que, na prática, aumenta a carga sobre os serviços. Além disso, recorrentemente, volta à baila a ideia de tributo sobre as transações, tal qual a velha CPMF.

A necessidade de preservar ou de aumentar a arrecadação parece dominar o Ministério da Economia e os princípios liberais parecem ter sido deixados de lado.

Não é só uma questão da “montanha que pariu um rato”, mas da inversão das hierarquias – como se o Ministério da Economia tivesse se tornado uma sucursal da Receita Federal.

As propostas em trâmite no Senado e na Câmara também deixam muito a desejar do ponto de vista da liberdade econômica.

São complexas em demasia (especialmente a proposta da Câmara), não sinalizam para racionalização e simplificação dos procedimentos e parecem resultar em aumento da carga tributária.

Não há sistema tributário perfeito. Os conflitos de interesses e a capacidade real de formar consensos impedem disso ocorrer.

Teríamos que “começar do zero”, desenhando um sistema tributário antes de se constituir a sociedade – ou seja, impossível – como ironiza o Nobel de Economia, Paul Samuelson.

Porém, ao menos gostaríamos de ter um sistema simples e que não desestimulasse a produção de bens e serviços nem que pesasse sobremaneira sobre os mais pobres.

Por Vladimir Fernandes Maciel é Coordenador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica e professor do Mestrado Profissional em Economia e Mercados da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Esther Vasconcelos

Estudante de nutrição e apaixonada por meios de comunicação, trabalhando atualmente como redatora no Jornal Contábil.

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